quinta-feira, 24 de julho de 2014

Saudade

 
 
Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura.
Doi-me a lembrança
do vestido
caindo aos nossos pés.
 
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
 
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
Eu
que longe de ti sou fraca
Eu
que já fui àgua, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz
 
Tráz
de novo, o meu amor,
a transparência da àgua
dá ocupação `minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono.
 
(Mia Couto)


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